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“LES PUF” EM PARIS – UMA LIVRARIA DE NOVO TIPO

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A nova livraria da PUF – Presses Universitaires de France, ocupa um espaço de menos de 80m2. Não está longe do local onde existiu entre 1921 e 2006, na Place da la Sorbonne, e que era um ponto de encontro dos estudantes e da intelectualidade francesa. No entanto, a nova livraria disponibiliza aos clientes todos os 5.000 títulos da editora (mais 2.000 títulos anteriormente fora do catálogo nos próximos meses) e três milhões de outros títulos, que incluem os publicados pelas maiores editoras dos EUA, e um crescente número de títulos franceses.

puf 1E ainda tem um café, onde os clientes esperam a impressão do livro.

Tudo isso é possível porque a livraria usa a Expresso Book Machine, que imprime e faz o acabamento de um livro a cada cinco minutos, em média. Veja detalhes sobre a inauguração, acontecida no último dia 12 de março aqui e aqui.

Publiquei anteriormente três posts sobre a Expresso Book Machine. O primeiro, em setembro de 2012,  contava como a máquina foi desenvolvida a partir de uma ideia de Jason Epstein, lendário editor de Nova York, um dos fundadores da New York Book Review e visionário da indústria editorial. A máquina de livros é fabricada pela On Demand Books.

No meu segundo post sobre a Expresso Book Machine tratei do avanço na solução de um dos gargalos para o sucesso da máquina, que é a disponibilização, pelas editoras, dos arquivos para que a EBM possa produzir seus livros sob demanda em cada máquina licenciada. Em janeiro de 2013, a Penguin USA (antes da fusão com a Random House), anunciou que faria isso.

Alexandre Gaudefroy, gerente da livraria, e os tablets que permitem a consulta dos títulos à venda.
Alexandre Gaudefroy, gerente da livraria, e os tablets que permitem a consulta dos títulos à venda.

Em 2015, quando estive no Salon du Livre de Paris, na edição em que o Brasil foi homenageado, vi pela primeira vez duas dessas máquinas operando, e publiquei mais um post sobre o assunto. Uma no estande da On Demand Books, onde entrevistei Jason Beatty, Vice-Presidente Senior de vendas e desenvolvimento de negócios, e outra precisamente no estande da PUF. Na ocasião, fiz questão de levar aos dois estandes o então presidente da FBN, Renato Lessa, o Presidente da CBL, Luís Antonio Torelli e o então presidente da Editora da Unesp e Secretário Executivo do PNLL, prof. José Castilho.

Minha esperança era que algum deles (ou os três em conjunto), encontrassem um meio de trazer uma dessas máquinas para a Bienal do Livro de S. Paulo, este ano. Fiquei na esperança, pelo visto.

Não seria um empreendimento fácil. A máquina custa caro (cerca de cem mil dólares). Segundo Beatty, isso não impede que mais de trezentas já estejam instaladas nos EUA, várias das quais em livrarias independentes. Na Europa, o país que mais as importou é precisamente a França.

Na França, a Espresso Book Machine é explorada por um consórcio constituído pelo IRENÉO,  um programa de pesquisas sobre a impressão de livros sob demanda, que faz parte do  IDEP (Institut de développement et d’expertise plurimédia)  e pela UNIIC (Union nationale des industries de l’impression et de la communication),  que seria mais ou menos o equivalente da ABIGRAF brasileira. Esse consórcio adquiriu seis máquinas para uso em escolas e universidades. Uma delas está alugada pela PUF por dois anos, o que reduz substancialmente o investimento fixo inicial. A editora, que é essencialmente uma casa de publicações universitárias (inclusive a famosa coleção “Que sais-je?”), qualificou-se assim para receber uma das máquinas importadas.

puf 3Essas informações deixam claro que a implantação desse tipo de máquina exigiria um esforço combinado de entidades públicas e privadas que estivesse voltada para o desenvolvimento da indústria editorial e livreira. Certamente isso se enquadraria em uma política de promoção do livro e da leitura, com os benefícios adicionais de melhorar substancialmente o lado logístico da distribuição de livros no Brasil.

Hélas¸ diriam os franceses, essa é uma tarefa particularmente difícil no Brasil de hoje: crise econômica, políticas de “salve-se quem puder” também na área editorial, e uma crônica incapacidade dos segmentos de editores, livreiros e gráficos para pensar e atuar coordenadamente em benefício comum, tudo se compõe para aumentar as dificuldades.

Certamente a Expresso Book Machine não é uma solução mágica para a indústria editorial e muito menos para as livrarias. Mas certamente é um esforço em busca de construir um conjunto de soluções para os problemas do setor, e que interferem diretamente nos índices de leitura dos brasileiros. As dificuldades de logística, o preço dos livros, a situação vergonhosa dos sistemas de bibliotecas públicas são componentes dos baixos índices de leitura.

Com o abandono muito provável pelos próximos dois anos dos programas de aquisição de livros de literatura para as escolas públicas (e oxalá o do livro didáticos também não seja reduzido), agravando uma situação que já se desenhava como ruim desde o ano passado, pensar na Expresso Book Machine por aqui é, como diria o Millor Fernandes, apenas um exercício de livre pensar. Que é só pensar e como tal não custa nada.

O que ainda dá um sopro de esperança nesse caso é que eu soube da livraria da PUF pela notícia publicada na edição do dia 13 de junho do New York Times. E lembrei da época do Henfil nos EUA, e o bordão que ele usava nos “Diários de um Cucaracha” no Pasquim (depois virou livro, hoje só em sebos, já que não temos uma Expresso Book Machine por aqui…), dizendo que uma coisa só ficava importante quando era publicada no jornalão da Grande Maçã. Como isso aconteceu, quem sabe… (apesar do NYT ser financiado pelo PT, segundo o Fiúza, colunista de O Globo e da revista Época).

VALE CULTURA E MERCADO EDITORIAL

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A Ministra Marta Suplicy divulgou semana passada os primeiros dados da movimentação financeira do Vale Cultura, dizendo “que há um consumo muito maior de livros e revistas”, e acrescentando que as editoras e livrarias haviam saído na frente e se preparado.

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Bom, os números não mentem e informam que 88,09% dos gastos com o Vale Cultura foram feitos em empresas cujo CNAE as coloca na categoria de “Comércio Varejista de livros, jornais, revistas e papelarias” (4761-01).  O cinema veio em seguida, e depois a venda de instrumentos musicais, o segmento de CDs, as artes cênicas, com “outras atividades culturais” no fim da fila.  Ou seja, dos R$ 13,7 milhões consumidos em seis meses, R$ 12,112 milhões foram para livros, jornais, revistas e papelarias.

O que pensar disso tudo?

A primeira constatação, claro, é que isso é ótimo. Na verdade, o que todas as pesquisas sobre hábito de leitura indicam, sempre, é que a leitura é muitíssimo bem considerada pelos brasileiros. Para formação, informação, cultura, educação e lazer. E para a religião também (a esmagadora maioria dos leitores coloca a leitura da Bíblia como sua atividade preferida na área). O que atrapalha a leitura é realmente a dificuldade de acesso. Além dos que declaram não conseguir ler corretamente, ou que preferem outras atividades.

Outra informação importante da notícia que veiculou os números do Vale Cultura é que a Ministra anunciou esses resultados em um evento na Federação dos Sindicatos de Metalúrgicos da CUT, em S. Bernardo. A Ministra foi lá – e tem feito atividades semelhantes em outros segmentos – para estimular os sindicatos a incluir o Vale Cultura na pauta das reivindicações nas campanhas salariais.

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AS LIVRARIAS QUEREM SE ATUALIZAR?

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Matéria publicada nesta segunda-feira no Estado de S. Paulo relata que as grandes livrarias (no caso, as paulistanas Cultura, Saraiva e Livraria da Vila) estão desenvolvendo um esforço especial para a melhoria de suas operações na internet, em detrimento da expansão da rede física.

Vamos tentar ver isso mais de perto.

Quando a Amazon foi lançada, anunciava-se como a maior livraria do mundo, disponibilizando mais de um milhão de títulos. Certamente não tinha nada disso em seu estoque. Jeff Bezos constatou o óbvio: as livrarias podem trabalhar com o estoque das editoras, que lhes dão prazo e o desconto que proporciona a margem.

Só que, no caso das livrarias físicas, o livreiro deve sempre fazer o balanço entre os títulos que vendem com mais rapidez, os best-sellers, e uma seleção, dentro do milhão de títulos disponíveis nos catálogos das editoras, daqueles que acham que pode dar a “cara” da loja. E aí, sim, montar o sortimento da livraria, seu estoque.

A Amazon não precisava disso. O investimento foi dirigido basicamente para permitir que os clientes achassem os livros que desejavam no meio da cornucópia de títulos oferecidos. O resto é história. Até hoje a Amazon só mantem em seus centros de distribuição a quantidade de títulos que seus cálculos determinam que podem ser vendidos no período que vai entre o pedido do comprador e a entrega do exemplar pela distribuidora ou pela editora.

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Québec discute preço fixo para os livros

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O Parlamento do Québec discute esta semana a aprovação de uma lei do “preço fixo” a vigorar na província, à semelhança da legislação francesa.

O Québec apresenta singularidades interessantes. É a província do Canadá onde a presença da colonização francesa ainda é muito forte. Montréal é uma bela cidade, e Québec Ville mais ainda (conheço as duas, onde estive pela primeira vez ainda nos anos 1980 para visitar uma feira de livros, a convite do governo canadense).

Oficialmente, o Canadá é um país bilingue, e todos os documentos oficiais, sinalização de estradas, nome dos edifícios públicos, etc, devem estar em inglês e francês. Os moradores do Québec, entretanto, se queixam de que tem que aprender a falar inglês para se comunicar com seus compatriotas anglófonos, que não fazem a menos questão de aprender francês (é verdade que é um francês com um sotaque horrível…). E além da Université de Montréal, em Montréal há também a McGill University, onde todo é em inglês.

Para compensar essas desigualdades, o governo do Québec frequentemente toma iniciativas que diferenciam a província do restante do Canadá, e de modo marcante. A iniciativa do “prix fixe” é uma delas.

Os editores, livreiros e bibliotecários québequoises apoiaram com veemência a iniciativa, através de suas associações. Mas os editores de língua inglesa (em grande medida filiais das empresas americanas) não gostaram muito da ideia.

Será interessante ver o resultado da iniciativa. Em primeiro lugar, para ver se a lei é efetivamente aprovada. Em segundo lugar, como se comportará o mercado livreiro nas duas grandes zonas linguísticas do Canadá.

A matéria do PublishersWeekly sobre o assunto está aqui (em inglês)

A INTERVENÇÃO GOVERNAMENTAL PODE SALVAR AS LIVRARIAS? NA FRANÇA, TALVEZ.

Reproduzimos em seguida o artigo publicado Na Publishing Perspectives no dia 28 de março passado. Talvez possa provocar reflexões úteis por aqui.

Dennis Abrams

LIR
A França possui uma forte rede de 3.500 livrarias independentes. E o governo está fazendo todo o possível para mantê-las vivas.

Em 2009, o governo implementou o há tempo esperado selo de “Librairie Indépendante de Référence”,  um selo que classifica as livrarias tal como um crítico poderia qualificar uma garrafa de vinho. Para se qualificar e receber o selo LIR, que é válido por três anos, as livrarias devem preencher seis condições, entre as quais a que a livraria tenha um papel cultural importante na comunidade, organizando leituras e eventos culturais; que tenha empregados que contribuam para a qualidade do serviço e que o proprietário seja o responsável pela compra de estoques; que a loja mantenha uma grande seleção de livros – tipicamente pelo menos 6.000 títulos, a maioria dos quais deve ter sido editada há pelo menos um ano ou mais.

As livrarias com o selo LIR recebem incentivos fiscais e subsídios especiais administrados pelo Centre National du Livre, inclusive empréstimos sem juros para melhorias na loja e Continue lendo A INTERVENÇÃO GOVERNAMENTAL PODE SALVAR AS LIVRARIAS? NA FRANÇA, TALVEZ.

VENDA DE ESPAÇOS OU CURADORIA – SERÃO ESSAS AS ALTERNATIVAS PARA AS LIVRARIAS?

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Neste final de ano foram publicadas duas matérias sobre livrarias que me chamaram muita atenção. As duas tratavam de ambientes das lojas e sobre seu estoque, vistas de maneiras muito, mas muito distintas.

A primeira, publicada na Folha de S. Paulo, no dia 29 de dezembro, tinha a manchete “Concorrência inflaciona aluguel de espaços nas livrarias e reduz variedades de estoques”. Era assinada pela Raquel Cozer, que cobre a área para o jornal paulista e mantém também um blog, o “Biblioteca de Raquel”.

A segunda matéria, publicada no último dia do ano n’O Globo, era assinada por Priscila Guilayn, correspondente do jornal na Espanha, tinha como manchete “Em Madri, um novo palácio para a literatura” e tratava da inauguração de uma grande livraria anexa ao Museu Reyna Sofia, com uma área de 1.200 m2, a 500 metros de distância da Puerta del Sol, um dos pontos de maior movimentação da capital espanhola.

A matéria da Raquel Cozer destacava como os espaços de exposição em cadeias de livrarias eram objeto de concorrência cada vez mais acirrada entre as editoras, na busca de destaque para os livros que consideravam como seus candidatos a best-sellers para as vendas de Natal. Na verdade, “candidatos” é um termo enganador. Os investimentos das editoras nesses títulos os levavam quase que inexoravelmente para as listas dos mais vendidos e isso, vice-versa, aumentava a sua demanda nas lojas.
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Políticas públicas – continuidade, avaliação e coragem para mudar

Participei de uma mesa na 22ª. Convenção de Livrarias, sobre políticas públicas para o livro e leitura. Estava com a prof. Antonieta Cunha, que é a Diretora de Livro e Leitura da FBN, Tuchaua Rodrigues e Gerson Ramos, que se ocupam do programa do Livro Popular e da Livraria Popular, da Biblioteca Nacional. Presto uma consultoria ao programa, mas não ocupo nele nenhuma posição executiva.

O Programa do Livro Popular, que mudou o paradigma de compras de acervos para bibliotecas públicas, abrindo espaço para que as própias bibliotecas escolham o que desejam e recebam os recursos para adquirir os acervos através das redes de livrarias, já apresenta números muito interessantes, e a Ministra da Cultura, Ana de Holanda, e o Presidente da FBN, Galeno Amorim, anunciarão nesta quinta-feira, dia 9, na Bienal do Livro de S. Paulo, sua segunda etapa.

Como todo programa inovador, que rompe com paradigmas anteriores, o Programa do Livro Popular, ou livro de baixo custo, apresentou vários problemas em sua execução. Era inevitável. É impossível prever todas as contingências. O importante é manter os canais de comunicação abertos, avaliar o desempenho a cada momento e corrigir os rumos. Isso está sendo feito e a resposta de bibliotecas e livrarias é muito boa.

Mas não falei especificamente sobre o assunto naquela mesa. Outro dia comentarei os números e o desempenho do programa.

O que tentei abordar na minha intervenção foram algumas características de políticas públicas que dessem à plateia de livreiros e editores um marco em torno do qual pudesse ser feita uma discussão produtiva sobre o tema.
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O ATENDIMENTO E O FUTURO DAS LIVRARIAS

O desenvolvimento da Internet e dos livros eletrônicos há muito me faz pensar sobre o futuro das livrarias. Mais que o “futuro do livro”, o que vai acontecer com esses lugares que frequentamos para folhear livros, ver as novidades e – eventualmente – comprá-los, é o que me preocupa.
Há uns dois anos a ABA – American Booksellers Association – encomendou a uma consultoria um estudo sobre as alternativas para as livrarias independentes enfrentarem esse fenômeno. E a mesma ABA há vários anos havia desenvolvido o BookSense, um sistema de compras online que transferia a compra e o atendimento para a livraria que estivesse mais próxima do Zipcode (CEP) de quem fizesse o pedido. O BookSense deu fôlego para as livrarias independentes, mas o crescimento da Amazon e da Barnes&Noble sombreiam permanentemente o futuro das independentes.
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Revistas de livrarias – para onde vai a atenção dos leitores e o dinheiro das editoras

Achar os leitores é uma preocupação da indústria editorial. Nos velhos tempos, os críticos literários é que “achavam” os autores, e a consagração feita pelos famosos “críticos de rodapé” era o sinal de ingresso no cânone da literatura nacional. A antiga José Olympio tinha como padrão transcrever, nas páginas iniciais do livro, a “fortuna crítica” do autor. Autores e críticos se retroalimentavam em prestígio, e o prestígio resultava em vendas.
Essa contradança acabou. Não existem mais “rodapés literários” e as resenhas estão longe de proporcionar o prestígio – e as vendas – de antanho. O prestígio do autor (muitas vezes respaldado pelo prestígio – ou poderio – da editora) aparece não em críticas, mas em amplas matérias na capa dos cadernos “de cultura”, ou variedades.
Ora, esse espaço se reduz cada vez mais. E se publicam cada vez mais livros. Por conseguinte, divulgar os lançamentos se torna ao mesmo tempo mais importante e mais difícil.
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