O Salon du Livre de Paris, que este ano homenageou o Brasil e serviu de palco para apresentação de dezenas de autores brasileiros, mesas redondas, apresentações várias – e permitiu que vários autores viajassem para outras cidades, como extensão da programação – é uma feira que, sob muitos aspectos, é bem parecida com nossas bienais. Mas com algumas diferenças marcantes.
Estive ali para participar de dois eventos. O primeiro foi uma mesa redonda para apresentação do programa Conexões Itaú Cultural – Mapeamento Internacional da Literatura Brasileira, do qual sou um dos curadores, juntamente com o Professor João Cezar de Castro Rocha, que também estava presente em Paris. A segunda atividade foi a mesa redonda de apresentação do número 6 da Machado de Assis Magazine, publicação co-editada pela Biblioteca Nacional e o Itaú Cultura, da qual sou o editor.
Foram duas mesas interessantes. Na primeira, além do Prof. João Cezar e de mim, contamos com a presença do Professor Pierre Rivas, da Université Paris X – Nanterre. A surpresa foi verificar a sala – dentro do estande brasileiro – completamente lotada. Eram quase oitenta pessoas, entre brasileiros que moram na França e franceses estudiosos ou interessados na cultura brasileira, inclusive vários dos mapeados do programa, como Rita Olivieri- Godet, Saulo Neiva, François Weigel e Michel Riaudet, além de outros que se prontificaram a responder ao questionário online do programa. Francamente, em eventos no Brasil, a presença nesses tipos de apresentação é geralmente bem menor.
Apresentamos aspectos gerais do programa, e das atividades do Itaú Cultural na promoção da literatura e da cultura brasileira no exterior, além de dados já extraídos de informações do banco de dados online.
Na segunda mesa, depois da abertura oficial feita pelo Ministro Juca Ferreira, apresentamos o número 6 da Machado de Assis Magazine. Além de textos em inglês e espanhol, esse número apresentou excertos de autores brasileiros também em francês. A mesa contou com a presença do Presidente da FBN, Renato Lessa, de Jefferson Assumpção, Diretor da área de Livros, Leitura, Literatura e Bibliotecas do MinC, e do escritor Fernando Morais, que já teve excerto publicado em um número anterior da Machado de Assis Magazine.
Depois de participar das duas mesas, ainda na sexta-feira e no sábado, percorri o Salon para observar as presenças e suas características.
Uma primeira observação foi a de que os alunos de escolas públicas (presentes na sexta-feira), não eram tão numerosos como nas bienais e feiras brasileiras. E, mais importante, visitavam o Salon preparados pelos professores. Não se viam meninos correndo desorganizados pelos corredores. As turmas se dirigiam para estandes que, suponho, hajam sido previamente escolhidos pelos professores, para autógrafos ou palestras de escritores definidos. Uma diferença importantíssima.
Uma segunda observação foi a de que os autores presentes nos estandes – em sua esmagadora maioria – efetivamente recebiam leitores de seus livros para oferecer autógrafos. No estande brasileiro, onde se revezaram os autores presentes, certamente havia um número maior de leitores na expectativa de autógrafos dos mais conhecidos. Mas todos tiveram leitores.
Não notei estandes com saldos e preços de ocasião. Os livros de lançamento mais antigo tinham descontos, sim. Mas nada da profusão de pontas de estoque que temos visto por aqui.
Já no dia da abertura do Salon havia notado a presença de um estande com uma Expreso Book Machine em exibição. Já escrevi dois posts mencionando essa máquina de fabricação de livros, aqui, e aqui.
A Espresso Book Machine é uma combinação de impressora reprográfica com máquina de acabamento, acoplada a um programa e um acervo online, e produz um livro completo em questão de minutos. Os formatos podem variar de 11,43 cm x 12,70 cm até 20,95 cm X 26,03 cm, próximo ao formato A4, que é o tamanho do papel da bandeja de alimentação.
Conversei com Jason Beatty, Vice-Presidente Senior de vendas e desenvolvimento de negócios da On Demand Books, que fabrica as máquinas. Ele me disse que já existem quase trezentas máquinas instaladas. A maioria nos EUA, mas também na Europa. A França é um dos países que tem mais equipamentos desses instalados. E o estande da PUF – Presses Universitaires de France, no Salon du Livre, também tinha um dos aparelhos.
Segundo Beatty, já existe uma quantidade significativa de editoras que disponibilizaram os arquivos digitais para uso pela Espresso Book Machine. Instalada em livrarias, como a independente McNally Jackson, em Nova York a Espresso é usada também por autores de auto-edição, que levam os arquivos em pen-drive, imprimem seus exemplares e os deixam arquivado na memória, para venda a possíveis outros interessados.
Aqui, o livro que imprimiram para mim, na hora. O miolo também é a cores.
No site deles existem vídeos profissionais sobre o esquema de funcionamento, mas fiz três filmetes no celular mostrando o funcionamento da máquina, e uma breve entrevista com um dos engenheiros que a desenvolveu.
Aqui, a máquina instalada no estande da PUF.
Levei o presidente da CBL, Torelli até o estande, para conhecer a máquina e ver a possibilidade de trazê-la para a Bienal de S. Paulo no próximo ano. Ele e o prof. Castilho, secretário executivo do PNLL e diretor da Editora da UNESP conversaram com Jason Beatty.
Quais as dificuldades? A primeira, obviamente, é aumentar o número de títulos disponíveis. Aos poucos, nos EUA e na Europa, as grandes editoras disponibilizam os arquivos. O sistema encripta os arquivos e comunica online às editoras cada exemplar impresso, para que seja faturado à livraria. Aqui, com o conservadorismo das nossas editoras, não sei qual seria o ritmo de adoção.
Mas outro grande fator impeditivo é o preço. O modelo que estava exibido em Paris era acoplado a impressoras de última geração. O núcleo de acabamento pode ser acoplado a uma grande quantidade de modelos de todos os fabricantes: Xerox. Canon, HP, Kyocera, etc. Só que, no formato que vi, o custo, nos EUA, era de US$ 100.000 (cem mil dólares). Aqui, com os impostos, não sei quando custaria. Evidentemente o uso da Espresso Book Machine exige um plano de negócios que torne essa importação viável.
No terreno das curiosidades, notei dois estandes.
O primeiro, um estande que promovia o B-Sensory. É um programa de “leitura” de livros eletrônicos especialmente desenhado para leitoras. O programa é acompanhado de um “brinquedinho”, gentilmente denominado “Little Bird”. O “passarinho” é um vibrador, a ser devidamente colocado no orifício conveniente, e que dispara nos trechos selecionados pelo programa, com dez velocidades selecionáveis. Pelo tato sobre o texto, ou mesmo com um “sopro” da leitora, ou de seu parceiro, que pode participar do empreendimento cultural. A B-Sensory procura editoras parceiras para implantar seu programa em títulos de livros eletrônicos, que pode-se dizer que são efetivamente “enhanced”. A restrição a leitoras provavelmente é resultado de alguma motivação feminista. Qui sais-je?
No outro extremo do uso de artifícios eletrônicos, a Edition des Femmes mostrava vários exemplares de sua “Bibliothèque des Voix”, audiolivros em CD lidos por algumas atrizes e autores mais conhecidas na França.
Aqui, fotos do livro e CD de Clarice Lispector lido pela bela Fanny Ardant. Evidentemente, é coisa fina, escutar as autoras brasileiras na voz de uma das mais expressivas e belas atrizes francesas.
Quem sabe nossos organizadores de feiras e bienais de livros tenham aprendido com os franceses como ter eventos literários sem os saldões e ponta de estoque.
Aí já é querer demais, Ednilson… Não conseguem aprender nem a separar a balbúrdia das crianças do resto dos expositores.