Arquivo da categoria: Colunas do Publish News

Direito Autoral e acesso aos livros

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A Publishing Perspectives publicou no dia 2 de agosto uma matéria muito interessante, sob o título “Does Copyright Make Books Disappear?”, que aborda estudo feito por Paul J. Heald, da University of Illinois (com uma grande equipe de colaboradores), no qual o professor de direito examina dados estatísticos sobre a presença de títulos de livros no mercado, conforme estejam ou não ainda sob a proteção das leis de direito autoral.

O artigo foi escrito no contexto da pressão continuada de parte do mercado de “produtores de conteúdo” para a extensão do período de proteção pela legislação de direito autoral, que hoje é de 70 anos após a morte do autor (ou no máximo 95 anos da data de publicação para obras de encomenda, de autoria desconhecida, etc.). Essa pressão acontece há anos e já levou o aumento de 60 para 70 anos, alguns anos atrás. Uma das principais empresas interessadas no assunto é a que leva o nome de Walt Disney, que morreu em 1966 (e cujos direitos estão protegidos até 2.035, ou talvez até 2061, pelo menos em alguns casos). Os caras não querem perder o controle do pato, do rato e dos demais personagens em “tão pouco tempo”!!!

O artigo do prof. Heald é muito interessante. Usando dados estatísticos compilados de forma muito extensa (dados do ISBN, da Library of Congress e da Amazon – para os livros no mercado, assim como da Apple e outros sistemas de registros de músicas). Vou me concentrar aqui no caso dos livros. Mas vale a pena ler o artigo para ver o que ele escreve sobre músicas (o problema é semelhante), e nota que as músicas brasileiras estão em segundo lugar entre as mais baixadas via Internet.
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Preços de e-books no Brasil. Conquista de mercado e indiferença

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Há alguns dias fiz uma pesquisa de preços para comprar um livro que me interessava. Queria ler The Financial Lives of the Poets, de Jess Walter. Sabia que havia uma tradução e resolvi verificar se leria o livro em inglês ou na tradução, e se havia disponibilidade dessa tradução em e-book, fosse no formato ePub ou Kindle.

Havia. A Benvirá, editora no Brasil, vendia (exclusivamente) na loja da sua matriz, a Saraiva o livro em formato ePub. O preço de capa do livro impresso era R$ 39,90, adquirido na Saraiva saía por R$ 33,90 e o e-book… custava R$ 35,90! (Isso até o dia 22. No dia 23, o site apresentou uma mudança significativa: passou a vender os dois formatos pelo mesmo preço de R$ 35,90.

Ou seja, a Benvirá dava 15% de desconto para quem comprasse o livro na Saraiva, mas quem o adquirisse para ler no app da cadeia de livrarias ou em algum Kobo ou tablete, ganhava só míseros 10%. A Saraiva, como se sabe, não vende nenhum e-reader próprio. Apenas disponibiliza app para quem quiser ler nos desktops ou em tablets.

À surpresa seguiu-se a perplexidade. Quem seria idiota o suficiente para comprar um e-book, depois de ter gasto no mínimo mais R$ 259,00 (Kobo mini) ou R$ 299,00 (o Kindle mais barato), para pagar mais caro que o livro impresso? Afinal, quem tem ou pensa em comprar um e-reader (ou um tablete, que é mais caro, mas é multiuso) sabe perfeitamente que a grande vantagem dos e-books está no preço, e que um leitor assíduo amortiza rapidamente o investimento com o que economiza no preço dos livros.
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LIVROS BONS E LIVROS RUINS – COMO É MESMO ISSO?

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A distinção entre livros bons e livros ruins é algo que assombra o sentido comum. Afinal, cada um de nós qualifica o que lê (ou o que quer ou não ler) dessa maneira. É um bom livro (e por isso gostei dele), ou é um livro ruim (portanto, detestei). Fazemos isso todos os dias (e não só a respeito de livros, é claro), e esse exercício de distinção passa pela crítica, pelas resenhas de jornais e, certamente, pela avaliação das editoras que decidem publicar ou não determinado original.

O assunto desborda das escolhas individuais (ou empresariais) até para o terreno das políticas de aquisição de acervos para bibliotecas públicas. Há quem defenda que só devem ser colocados à disposição dos leitores não apenas livros bons, mas os que “transformem” o leitor em um ser humano melhor. E por aí vai.

Pierre Bourdieu, em seus estudos de sociologia, elaborou alguns conceitos que nos podem ser úteis. O sociólogo francês assinala que as avaliações de qualidade – ou aquilo que sua discípula Pascale Casanova viria a chamar de “capital literário” – depende de relações internas no campo da crítica, e da produção literária, no caso da que se considera culta. As disputas de poder no campo literário adquirem uma dinâmica própria, que leva a sucessivas transformações na escala de valores do que é considerado “bom”, “inovador”, “medíocre” ou de “mau-gosto” e assim sucessivamente.

Essas disputas dentro de campos podem muito bem ser – e de fato são – interpoladas com o que acontece em outros campos. Por exemplo, os livros que os pedagogos podem levar em alta consideração (no campo da pedagogia, ou como úteis para o ensino de literatura, por exemplo), podem não ser idênticos aos que os críticos literários talvez valorizem. Livros que esses consideram inovadores, ou que apontam para caminhos promissoramente transgressores (com um sinal positivo nessa transgressão), podem ser considerados nocivos pelos pedagogos.
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Direito de Empréstimo

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Nos últimos anos vem se firmando, principalmente na Europa, o recolhimento para autores e editores de somas que as bibliotecas pagam bibliotecas pelo empréstimo das obras ainda com direito de autor válido. Já escrevi sobre o surgimento e história das RROs (Reproduction Rights Organizations, ou seja, as Sociedades de Arrecadação de Direitos Reprográficos). E remeti também ao site da IFFRO mas vale a pena sintetizar aqui o assunto.

A questão dos direitos reprográficos surgiu, obviamente, quando máquinas de copiar se generalizaram, do final dos anos 1960 em diante. O nome da Xerox, uma das empresas pioneiras na área, chegou a ser usado como sinônimo de qualquer cópia reprográfica (“xeroqueia isso aqui”). As disposições da Convenção de Berna sobre o chamado “fair use” estavam centradas, até então, nas reproduções não autorizadas de obras protegidas em formato impresso, e regulavam o tamanho e a forma das citações, de modo que estas não caracterizassem plágio ou cópia não autorizada. Com as máquinas “xerox” a coisa mudou de figura e levou, principalmente a partir dos anos 1970, ao surgimento dessas sociedades de arrecadação de direitos reprográficos. A IFRRO começou a ser pensada em 1980, a partir do estabelecimento de um grupo de trabalho conjunto da Associação Internacional dos Editores (IPA) e do Grupo Internacional de Editores de Obras Científicas, Técnicas e de Medicina (STM). Em 1988, em uma reunião em Copenhagen, a IFRRO foi formalmente fundada como federação das RROs existentes, a mais antiga das quais havia sido constituída apenas em 1973.

Basicamente, uma associação de administração de direitos reprográficos está constituída por autores e editores, unidos na administração desses direitos. Os resultados do recolhimento das licenças é geralmente dividido entre os dois tipos de interessados, deduzidos antes os custos de administração, que estão por volta de 10% do arrecadado. Informações adicionais sobre esse processo podem ser vistas nos sites mencionados.

O recolhimento de direitos dava-se essencialmente através de dois mecanismos: a) licenciamento das reproduções, geralmente cobrada por página copiada de um livro; b) taxas sobre equipamentos de reprografia, cobradas no momento em que estes são vendidos. Os modos de cobranças, a combinação entre os fundos provenientes do licenciamento ou das taxas têm variações nacionais importantes, que os interessados podem conhecer mais de perto também nos sites mencionados. A maioria das RROs está na União Europeia, mas a Copyright Clearance Center, dos EUA, é uma das maiores sociedades de arrecadação, recolhendo mais de 250 milhões de dólares em 2011.
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Biblioteca Nacional e PNLL: o vai-e-vem institucional

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Há quase dez anos, escrevi e publiquei um livro no qual repassava experiências e reflexões sobre décadas de envolvimento com o livro. O Brasil pode ser um país de leitores? Política para a Cultura, Política para o Livro (Summus Editorial, 2004) é um livro no qual uma boa parte do que escrevi continua, na minha opinião, válida. Houve mudanças, é claro, e espero em breve poder sintetizá-las.

Algumas dessas mudanças dizem respeito às estruturas governamentais ligadas ao assunto. No caso, o MEC e o MinC. E, no caso do MinC, a trajetória falhada da Secretaria do Livro e Leitura e da Biblioteca Nacional. A SLL havia sido criada pelo Ministro Weffort, e não conseguiu se firmar precisamente porque muitas atribuições de políticas para o livro eram do então Departamento Nacional do Livro, que fazia parte da BN. Gilberto Gil só manteve a SLL por alguns meses, ocupada por seu amigo o poeta Waly Salomão. Depois que este morreu, a SLL foi extinta.

Mas começo repetindo o que escrevi na época:
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Cinema e livros: dois pesos e duas medidas

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Luiz Zanin Oricchio, crítico de cinema d’O Estado de S. Paulo publicou em seu blog – Cinema, a nossa imagem lá fora e no Caderno 2 – Nova diplomacia para divulgar a produção brasileira no exterior – artigo sobre recentes medidas da Ancine para a divulgação do cinema brasileiro no exterior. Os dois foram publicados no domingo, 19 de maio. O artigo do blog só se diferencia do publicado na edição impressa no acréscimo do nome de dez títulos do cinema nacional que seriam objeto da nova “diplomacia cinematográfica”.

Em resumo, Zanin Oricchio reporta que a Ancine “criou um programa para mostrar filmes brasileiros aos curadores de festivais internacionais”, em uma parceria entre o MinC e o Itamaraty para “solucionar um problema, a atual falta de visibilidade do cinema brasileiro no exterior”. Segundo Zanin “parte do problema se deve à falta de divulgação adequada”. Outra parte “tem a ver como a natureza da produção brasileira, ao menos como ela é percebida no exterior”. Segundo a matéria, os curadores de festivais “verbalizam um diagnóstico que coincide com muitos dos críticos de cinema patrícios [pois] estaria dividida entre filmes televisivos […] e filmes que, por reação, se colocam de maneira esteticamente muito fechada em relação ao público”. Esses dois tipos de filmes não interessam aos festivais. Mas Zanin Oricchio assinala a existência de filmes “de ambição artística porém sem menosprezo pelo público”.

“Fata de visibilidade”, “falta de divulgação adequada”? Onde será que li algo assim?

Diante dessa situação, Ancine – Ministério da Cultura – e Itamaraty bolaram o programa de divulgação.

A matéria não menciona valores.

Entretanto, alguém por aí ouviu falar em desperdício de recursos públicos para favorecer os produtores de cinema nacionais? Eu, pelo menos, não.
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O FIM DOS SUPLEMENTOS LITERÁRIOS

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A notícia recente do próximo fechamento do suplemento Sabático do Estadão reacendeu a indignação de escritores, críticos e leitores que ali encontravam um produto cada vez mais raro na imprensa impressa, resenhas críticas que ultrapassavam as limitações da simples notícia e, muitas vezes, análises mais detidas de fenômenos culturais importantes.

O fechamento do suplemento, e a diminuição em geral do espaço destinado aos livros nos jornais diários não é, certamente, um fenômeno novo. Os chamados “rodapés”, as colunas na parte de baixo das páginas, ocupadas por críticos de imenso prestígio social e cultural (nomes como Tristão de Ataíde, Álvaro Lins, Agripino Grieco, entre outros tantos), que praticamente determinavam a aceitação ou o esquecimento de autores, foram as primeiras baixas. O domínio exclusivo de um grande nome pontificando em cada jornal foi exitosamente substituído em alguns dos grandes jornais pelos suplementos de literatura, onde havia uma pluralidade de colaboradores (embora geralmente a partir de diretrizes comuns). O “Suplemento Literário”do Estadão (1956-1967) e o “Suplemento Dominicial” do Jornal do Brasil (1956-1961) são as lembranças mais recorrentes. Os dois foram substituídos pelo “Caderno Ideias”, no JB, e pelo “Cultura” e pelo “Sabático”, que agora se extingue, no Estadão.

Mas o que importa aqui não é a história dessas publicações, e sim uma rápida reflexão sobre os que as fizeram desaparecer ou mudar, e que perspectiva se vê pela frente.
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TERRITÓRIO POUCO EXPLORADO

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A Machado de Assis Magazine no. 3, recém disponível online, está dedicada a excertos de tradução de livros para crianças e jovens. São vinte autores brasileiros (dezessete com trechos em inglês e três em espanhol), a maioria com mostras das ilustrações dos respectivos livros. Com a ajuda dessa publicação, uma iniciativa conjunta da Fundação Biblioteca Nacional e do Itaú Cultural, e da qual sou o editor, eles partem para a disputa de uma fatia do mercado internacional.

A edição da revista ficou disponível no dia da inauguração da Feira de Bolonha, o principal evento internacional do segmento. Em 2014 o Brasil será o país homenageado nessa feira e, assim como o primeiro número da Machado de Assis Magazine se apresentou em Frankfurt antecipando em um ano a homenagem ao nosso país, a revista se apresenta na Feira de Bolonha como um aperitivo das ações que o governo, autores, ilustradores e editores farão, no próximo ano, na “Cidade Vermelha” italiana.
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Estatísticas, registros e outras questões do mundo dos livros

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O site Publishing Perspectives, editado pelo Ed Nawotka, é uma das fontes mais importantes de informações e, ao mesmo tempo, de questionamentos e interrogações sobre o que acontece no mercado editorial internacional. Ed Nawotka tem mostrado um interesse particular na indústria editorial brasileira, pois é ali que se publica um “filhote” da brasileira PublishNews que informa aos leitores em inglês sobre as novidades que acontecem por aqui.

Recentemente o PP publicou um artigo sobre a possibilidade de extinção do ISBN como identificador global e único de cada livro publicado. A ameaça proviria da Amazon (mais uma vez), que usa seu próprio sistema de identificação, e da Apple, que faz o mesmo. As duas parrudas, que publicam muito do que chamamos de autopublicação, simplesmente desprezam o uso do ISBN na identificação do que vendem, e esses autores “economizariam” a taxa cobrada pelas agências de ISBN mundo afora. No Brasil, a Agência Nacional do ISBN, controlada pela Biblioteca Nacional, cobra R$ 12,00 por registro, sem alternativas para aquisição de lotes. É muito mais barato do que cobra a Bowker nos EUA, que pede US$ 125 por registro individual, mas tem vários planos para aquisição de lotes. Na França o registro é gratuito para as publicações francesas e da francofonia, outorgados pela agência estatal. E por aí vai.
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OBRAS ÓRFÃS, PROBLEMA PENDENTE

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Uma das lacunas mais evidentes na legislação de direito autoral vigente é a que diz respeito às chamadas “obras órfãs”. O que é isso?

A lei de direitos autorais vigente estabelece dois parâmetros de tempo para a validade dos direitos de um autor sobre sua obra. O primeiro, evidentemente, é o da vida do autor. Depois que este morre, entretanto, seus herdeiros mantêm direitos sobre a obra pelos setenta anos consecutivos ao falecimento. Assim, em 2013, estarão entrando em domínio público obras de autores – sejam essas originárias ou derivadas (traduções e adaptações) – que tenham morrido em 1942 (a contagem se processa a partir de janeiro do ano seguinte ao falecimento).

Vejam bem, a validade do direito autoral não se dá a partir da data de publicação, e sim o da vida do autor e dos setenta anos decorridos depois de sua morte.

A chamada “obra órfã” é aquela sobre a qual se supõe que ainda existe proteção quanto aos direitos autorais, mas que a) não haja certeza sobre se o autor está vivo ou tenha falecido, e b) no caso de falecimento, se os setenta anos já transcorreram, e quem seria o herdeiro ou herdeiros dos direitos morais e patrimoniais da obra.

Acrescente-se aos problemas relacionados com o uso de tais obras a extensão ou restrição que se aplica ao conceito de “fair use”, que limita as cópias a pequenos trechos, tais como os usados comumente em citações.

As restrições da legislação são bem abrangentes. Por exemplo, a lei especifica (art. 29, alínea X), que está protegida, inclusive, “a inclusão em base de dados, o armazenamento em computador, a microfilmagem e as demais formas de arquivamento do gênero”.

Essas disposições estão previstas no escopo das diferentes versões da Convenção de Berna.
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