“Oh, e-books, como os amamos? Deixe-me contar de quantos modos…”

Transcrevo em seguida, por gentileza do Publishing Perspectives um artigo de Peter Cook sobre um instrumento de pesquisa sobre e-books feito pelo BISG – Book Industry Study Group e que comentarei em um próximo post.

Eis o artigo:

Oh, e-books, como os amamos? Deixe-me contar de quantos modos…
(Desde que pague US $ 6.750 pela subscrição da pesquisa)

Por Peter Cook (cortesia de Publishing Perspectives)

Os modos realmente estão sendo contados assiduamente e continuadamente, e disponíveis na ponta dos dedos em tempo real para editores pelo Book Industry Study Group (BISG). A última apresentação tem-que-ter-tem-que-ver é a da pesquisa em curso e continuada Consumer Attitudes Towards E-Book Reading (Atitudes dos Consumidores em Relação à Leitura de e-books) que esclarece e quantifica o tamanho e a profundidade da mais nova das paixões: quais são os e-readers mais “quentes”? Quais os que estão minguando? Que características os consumidores querem ter em seguida? O que mais compradores de e-books fazem ou consumem com seus aparelhos?
Continue lendo “Oh, e-books, como os amamos? Deixe-me contar de quantos modos…”

A projeção da cultura em um pequeno país

Ramón Villares é o presidente do Consello da Cultura Galega e esteve em S. Paulo esta semana como parte de suas atividades de difusão da cultura da Galiza. Está empenhado em que o Museu da Língua Portuguesa aumente o espaço dedicado ao galego na formação do nosso idioma. De fato, há quem defenda que o galego é tão somente uma variante do português, assim como o de Portugal e o do Brasil. A posição oficial do governo espanhol e da Comunidade Autónoma da Galiza, entretanto, é a de que o idioma tem características próprias e se diferencia do português, muito embora os dois descendam diretamente do galaico-português medieval.

Ramón Villares se refere à Galiza como “um pequeno país”. Para nós, brasileiros, onde as diferenças regionais não alcançam essa dimensão, essa afirmação soa um tanto estranha. Quem conhece a Espanha, entretanto, sabe perfeitamente que as quatro “autonomias” nas quais existe a forte presença de idiomas próprios – Catalunha, Valença, País Basco e Galiza – que essa é uma questão que toca fundo e implica em discussões sobre o que é ser “espanhol”.
Continue lendo A projeção da cultura em um pequeno país

Sem editores o livro não vive, sem tradutores, não viaja

O surgimento dos livros eletrônicos e a possibilidade de auto publicação tem levado muita gente a especular sobre o fim dos editores. Agora já não se fala mais tanto do “fim do livro”. Acho que a maioria já percebeu que livro não é tão somente o objeto físico, e sim seu conteúdo, difundido seja lá por que formato.

A bola da vez, agora, são os editores. E, como consequência, todo o processo editorial.

Fico feliz em discordar totalmente disso tudo.
Continue lendo Sem editores o livro não vive, sem tradutores, não viaja

O capitalismo selvagem no mercado editorial?

O Departamento de Justiça dos Estados Unidos seguiu o exemplo dos órgãos da Comissão Europeia e recentemente abriu investigação sobre o sistema de “agenciamento” praticado pelas principais editoras americanas depois que a Apple, com o lançamento do iPad, permitiu uma alternativa real à política de preços praticada pela Amazon.

Recapitulando brevemente.

Nos EUA o sistema de fixação do preço dos livros tinha características muito parecidas com o que é praticado no Brasil. As editoras estabelecem um “preço de capa” que, na verdade, é mais uma referência para os contratos que fazem com os autores para determinar os direitos autorais pagos, que são uma porcentagem sobre isso. Vendem para livrarias e distribuidoras com um “desconto” negociável entre as partes, e as livrarias e distribuidoras, daí para diante, praticam o preço que desejarem, transferindo parte desse desconto para os consumidores finais. Ou, visto de baixo para cima, os varejistas praticam o “mark up” que desejam a partir do preço líquido que pagaram às editoras.

Na Europa, há até alguns anos atrás, prevalecia o chamado sistema do “preço fixo”, no qual o preço de capa estabelecido pelas editoras deveria ser obedecido pelo varejo, com limitações de descontos, durante um certo período considerado como de lançamento. Descontos maiores só eram permitidos depois de terminado esse interregno. O sistema de “preço fixo”, tradicional, transformou-se em lei na França com o objetivo de proteger as livrarias independentes dos descontos oferecidos pelas “grandes superfícies” principalmente sobre os títulos best-sellers. A Comissão Europeia combateu muito o sistema, conseguindo sua eliminação em vários países, com a exceção da zona de fala alemã (Alemanha, Suíça e Áustria), e na própria França.
Continue lendo O capitalismo selvagem no mercado editorial?

Plágio, mentiras e o programa do Livro Popular

A Fundação Biblioteca Nacional divulgou, esta semana, resolução embasada no parecer da Comissão composta por membros do Conselho Interdisciplinar de Pesquisa e Editoração (CIPE), instituída para averiguar a reclamação da tradutora Denise Bottman sobre plágios e apropriação indébita do trabalho intelectual, praticada pela Editora Martin Claret ao inscrever vários títulos do seu catálogo no Cadastro Nacional de Títulos de Baixo Preço.

O parecer opinou pela “exclusão preventiva” das obras questionadas até que o assunto fosse julgado pelas instâncias judiciais pertinentes. O conselheiro Ivan Teixeira, em voto em separado, pediu a exclusão da Editora Martin Claret do cadastro, mas foi voto vencido.

A decisão da presidência da FBN, argumentando que a exclusão só pode ser feita “pela autoridade judicial competente”, optou por remeter o problema para o Ministério Público, sem suspender o cadastro das obras questionadas.

O imbróglio merece uma análise mais detalhada.
Continue lendo Plágio, mentiras e o programa do Livro Popular

Reprografia, direito autoral e licenciamento – para lembrar da história

Há muitos anos os editores e autores se preocupam com a cópia reprográfica de livros (as “cópias xerox”, como são conhecidas, embora a empresa deteste esse uso de seu nome), principalmente na área de não ficção. Para editoras científicas o assunto é muito sério, já que o investimento nessas publicações é alto, o retorno se dá através de operações com clientes institucionais – universidades, centros de pesquisa, redes de bibliotecas – que, em tese, estariam vulneráveis às cópias individuais desses materiais.

Os autores e editores de livros técnico-científicos em geral também sempre foram alvo das cópias não autorizadas de suas publicações. O que, certamente isso não preocupa certa categoria de “professores-doutores” que ganham mais com o prestígio de terem sido publicados do que com os direitos autorais provenientes das vendas.
Continue lendo Reprografia, direito autoral e licenciamento – para lembrar da história

Reprografia, Direitos Autorais e Bibliotecas

As recorrentes discussões sobre mudanças na Lei de Direitos Autorais (Lei 9.610/98) sempre apresentam a questão das cópias reprográficas (ou cópias xerox, como são comumente conhecidas) entre os pontos em discussão. E a tecla é sempre a mesma: os livros são caros, os estudantes precisam deles para seus cursos e, portanto, seria legítimo copiá-los sem problemas.

É um sofisma. Um carro é caro, e eu posso alegar que preciso de um para meu transporte, mas isso não me autoriza a entrar em uma concessionária, pegar uma chave e sair dirigindo. Mas se trata de “bens” diferentes, argumentam os defensores das cópias. Concordo. E proponho um exame mais de perto da questão.

Uma diferença importante entre livros e músicas, por exemplo, é que, para aqueles, a questão do acesso gratuito está equacionada há séculos. Na verdade, antecede mesmo à existência do livro impresso. Essa solução é conhecida universalmente pelo nome de BIBLIOTECA PÚBLICA. É um local, mantido pelo Estado ou por instituições dedicadas a isso, cuja função principal é permitir o acesso aos livros de forma gratuita.
Continue lendo Reprografia, Direitos Autorais e Bibliotecas

Leis e legisladores – o que interessa ao livro

Semana passada a coluna tratou do projeto de Lei do Deputado Eliene Lima – PP-MT, que pretende resolver os problemas do meio ambiente com o passe de mágica de imprimir os livros didáticos com papel reciclado. E tentei mostrar como alguns projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional ou são inúteis ou estão destinados a “não pegar”.

Entretanto, a quantidade de projetos e iniciativas parlamentares em tramitação no Congresso Nacional vai além disso. Época houve em que profissionalmente eu acompanhava o que era apresentado nas duas casas do Congresso, procurando detectar eventuais problemas para a liberdade de expressão, e particularmente a liberdade de publicação. Isso quando trabalhava na Câmara Brasileira do livro, até o começo do ano 2003. De lá para cá, apenas ocasionalmente vou ao site da Câmara e do Senado para ver o que há de novo, mas não acompanho com regularidade o assunto. Isso é tarefa para as associações profissionais.

Na época, o que mais me impressionava era as recorrentes tentativas de modificação dos artigos 150 e 220 da Constituição Federal. O Art. 150 é o que trata da imunidade fiscal para o livro e para o papel usado em sua fabricação. O Art. 220 é o que trata da Liberdade de Expressão. Impressionante como volta e meia apareciam tentativas de restringir de alguma maneira os efeitos desses dois artigos.
Continue lendo Leis e legisladores – o que interessa ao livro

O adeus ao bom senso

“O bom senso é a coisa do mundo mais bem distribuída: todos pensamos tê-lo em tal medida que até os mais difíceis de contentar nas outras coisas não costumam desejar mais bom senso do que aquele que têm.”
René Descartes – Século XVIII

Até já concordei com o filósofo iluminista. Mas, nos últimos tempos, nestes tempos de “politicamente correto” e quejandos, passei a considerar o pobre René um otimista exagerado. A coisa mais bem distribuída no mundo é a estupidez.

No Natal passado, quando os bancos “enfeitavam” a Av. Paulista com papais noeis, florestas encantadas, bimbalhos vários, a multidão extravasava das calçadas de modo impressionante. Sou testemunha, não apenas por morar perto da avenida e passar por ali a diário, como por ter cedido à tentação e ter levado minha neta, no colo, para ver os coloridos bimbalhantes.

A CET – Companhia de Engenharia do Trânsito de São Paulo percebeu que a movimentação de gente saindo das calçadas para o meio da rua provocava sérios riscos de atropelamento. E, em algumas noites, interditou trechos da avenida para automóveis, deixando-a entregue aos pedestres. Simples questão de bom senso e de cumprimento do dever. A questão não é simplesmente fazer os carros passar, mas proteger os pedestres.

Pois não é que um cidadão, imbuído do título de Procurador, membro do famoso Ministério Público, ameaçou processar o presidente da CET por estar descumprindo um “termo de ajuste de conduta” que autorizava o fechamento da Paulista apenas “x” vezes por ano e que aquela medida descumpria isso?

Depois que esse indivíduo (por favor, leitor, acrescente o adjetivo que achar mais conveniente) conseguiu seus cinco minutos (quinze já é demais) de fama na TV e nos jornais, alguém de bom senso deve ter lhe dado uns cascudos e o assunto foi esquecido.

E ontem lemos nos jornais que o Senhor Doutor Procurador do Ministério Público Federal de Uberlândia decidiu notificar a Editora Objetiva, que publica o Dicionário Houaiss por “conter expressões pejorativas e preconceituosas” em uma das acepções da palavra cigano.

Dizem duas acepções do Houaiss:

“5 (1899) Uso: pejorativo.
que ou aquele que trapaceia; velhaco, burlador
6 Uso: pejorativo.
que ou aquele que faz barganha, que é apegado ao dinheiro; agiota, sovina”

Ou seja, o indivíduo (por favor, leitor, continue usando o termo que melhor lhe parecer) demonstrou que não sabe o que é dicionário, o que é acepção.

Antes de notificar a editora, o indivíduo “enviou recomendações” para que o texto fosse modificado. Ou seja, do alto da sua (escolha aqui outro adjetivo) decidiu censurar uma obra de referência. Suposto guardião da lei, o elemento jogou de cambulhada no lixo várias das setenta e oito alíneas do Art. 5º. Da Constituição Federal, o que trata dos Direitos individuais.

O que leva à questão da reação das editoras.

A Objetiva, segundo a imprensa, alega que não recebeu a notificação. E diz que na nova edição do Houaiss (a edição mais compacta com a nova ortografia), essa acepção não existe. E, ademais, que a responsabilidade editorial pelo dicionário é do Instituto Antonio Houaiss.

Ora, estamos diante de um problema grave. Além do atentado ao senso comum e a demonstração de ignorância, pois não foi ao dicionário ver a acepção de acepção (“2 – Rubrica: lexicologia, linguística. Em lexicografia, cada um dos vários sentidos que palavras ou frases apresentam de acordo com cada contexto (ex.: ponto em pontuação, costura, geografia, geometria, jogos, rotina escolar etc.” – Dicionário Houaiss), o Dotô Procurador tenta praticar um ato de censura, atentando contra a liberdade de expressão. A Constituição Federal abriu um espaço desmedido para o arbítrio dos membros do Ministério Público aos lhes atribuir a tarefa de “II – zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia”.

Na aparência, isso daria aos membros do MP o poder de dar ordens, mas os direitos individuais e a exigência do processo legal obrigam a que isso seja feito por medidas judiciais, e não por “recomendações” dos promotores.

O fato é que a Objetiva agiu como se fosse algo absolutamente “normal” o MPF “mandar” fazer isso ou aquilo. Não é normal nem legal. E, no caso, é um atentado, como já disse, à liberdade de expressão e um ato de censura.

Não se ouviu nenhuma palavra tampouco das associações de editores. Nem a CBL nem o SNEL se manifestaram a respeito. E Roberto Feith, o executivo da Objetiva, é Vice-Presidente do Sindicato.

Nos anos 90 e até 2002 havia, na Câmara Brasileira do Livro, uma Comissão de Defesa da Liberdade de Publicação. Havia sido instituída seguindo uma diretiva da IPA – International Publishers Association. A Comissão se reunia apenas quando situações como essa se apresentavam. Para, pelo menos, protestar veementemente contra os abusos que se tentavam praticar.

Parece que, atualmente, nenhuma das entidades acha o assunto relevante. Pelo menos até agora, boca chiusa.

Esse Senhor Procurador acha que a essência das coisas está no nome. A simples enunciação da palavra a transforma em coisa real. Portanto, capaz de produzir portentos, “ser” racista, progressista ou que adjetivo lhe seja aposto. Se isso verdade fosse, os dicionários estariam ferrados. São compêndios de acepções que, se tomadas como verdades em si, provocariam verdadeiras síncopes nas sinapses cerebrais de quem as lesse, como esses feitiços nos quais a escrita é o próprio objeto da feitiçaria.

Nessas horas, juro, me lembro do nosso querido Macunaíma e fico querendo dizer, “Ai, que preguiça!”

No mais, meus caros, para desopilar, leiam a coluna do Tutty Vasques no Caderno 2 do Estadão do dia 29 de fevereiro.

A LEI QUE NÃO PEGA E A LEI INÚTIL – II


Há alguns anos o deputado Eliene Lima (PP-MT) amanheceu cheio de boas intenções e com desejos de ajudar a preservação do meio ambiente. Pôs-se a trabalhar e redigiu e apresentou o Projeto de Lei 2308/2007, com dois artigos. No primeiro estabelecia a obrigação das editoras usarem papel reciclado em pelo menos trinta por cento de suas publicações. No segundo tentava objetivar o que é papel reciclado: “é aquele proveniente do reaproveitamento de aparas produzidas pelos fabricantes, antes do consumo, ou a partir da coleta pós-consumo”.

O projeto rodou por comissões, teve audiência pública para debater seu conteúdo e, como tantas outras proposições legislativas, foi “esterilizado” nesse processo. A obrigação de usar papel reciclado virou “criação de linhas de crédito especiais para as editoras que assumirem um porcentual progressivo de papel reciclado”, na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável. Já na Comissão de Educação e Cultura, o relator, Severiano Alves (PDT-BA), redigiu parecer contrário à aprovação por faltar “capacidade operacional de coletar aparas que pudessem ser transformadas em papel reciclado em quantidade suficiente para atender à demanda que seria criada pela alteração legal pretendida”.
Continue lendo A LEI QUE NÃO PEGA E A LEI INÚTIL – II

Políticas públicas para o livro e o mercado editorial