Esta semana na Carta Capital, o repórter Lucas Callegari publica uma matéria interessante sobre a indústria editorial e as livrarias.
Lucas me enviou uma série de perguntas, que respondi por escrito.
Evidentemente essas são grandes demais para uma revista, e por isso vou publicá-las aqui, em vários posts.
– O que significa para o mercado brasileiro a entrada da Penguin no capital da Companhia das Letras? Este negócio pode ser visto como parte de movimento dentro do setor levando a uma maior concentração? Reforça a tendência maior presença das empresas estrangeiras adquirindo brasileiras? O que o mercado brasileiro tem de atrativo que pode ter motivado o negócio?
Não se conhecem os detalhes do negócio. Uma parte do investimento da Penguin foi a compra da participação de sócios minoritários, do responsável pelas finanças da empresa e de duas editoras da casa. Mas não sabemos se houve um aumento do capital, com a consequente redistribuição de cotas, ou se os ingleses compraram partes dos demais sócios. Nesse sentido não dá para saber se essa movimentação leva a uma “concentração” no setor dos livros gerais. Certamente abre portas estratégicas para a Companhia das Letras, que passa a fazer parte de um grupo com articulações internacionais do qual já fazem parte outras editoras.
A Pearson, que é a controladora da Penguin, já está no Brasil há vários anos, atuando na área dos livros técnico-científicos e do ensino de idiomas, e também nos “sistemas de ensino” (COC, Dom Bosco, Pueri Domus), e trabalhando para a adoção desses sistemas em municípios. Além disso, lidera uma ação de disponibilizar para universidades e colégios uma “Biblioteca Virtual” – e-books lidos em laptops e desktops – com a participação de várias editoras. Também montam edições específicas para cursos, uma atualização das famosas “pastas do professor” que antes eram produtos piratas em reprografia de trechos de livros, e que agora são legalizados e impressos sob demanda.
Algumas empresas estrangeiras já investem no setor editorial brasileiro há vários anos. A MacGraw-Hill, que tinha se afastado do Brasil, voltou; a Santillana, do grupo espanhol Prisa, adquiriu a Moderna – didáticos – a tem uma participação majoritária na Objetiva; a Edições SM – forte nas áreas de didático, livros infantis e dicionários, também está presente; A Planeta, de livros gerais e de enciclopédias (Barsa-Planeta) e colecionáveis, investe na formação de seu catálogo; Oceano, de livros porta-a-porta e colecionáveis; a Leya e a Babel, portuguesas. Outras editoras inglesas da área técnico-científica, que antes se faziam presentes apenas na importação de seus produtos, agora já começam a editar aqui, como a Cambridge e a Oxford. Enfim, o leque é muito amplo.
Por que vieram para cá?
Para além do Brasil estar “na moda” – várias chegaram antes disso acontecer – há um detalhe importante que se evidencia nas projeções demográficas: a nossa população é jovem, com uma imensa quantidade de pessoas inserida no sistema escolar, e essa situação deve continuar assim até aproximadamente meados do século XXI. Ora, o mercado educacional é a grande área de negócios do mundo editorial. Os livros de obra geral (trade, como são chamados na indústria), são muito vistosos e conhecidos, e seu valor econômico não é desprezível, mas é na área da educação e da produção de informação técnico-científica que se movimenta o grosso do investimento editorial. Contraste-se essa situação com a da Europa, onde a população envelhece e a pirâmide etária começa a se achatar… O Brasil, assim, se torna muito atraente. Claro que isso acontece também com outros países, mas poucos são tão grandes como Brasil, China – alvo de todas as cobiças – Índia e Rússia.
A concentração, por sua vez, é fenômeno típico do desenvolvimento capitalista, e se acelera nesses momentos de crescimento. Mas, note-se, a entrada no setor editorial é muito fácil. É mais fácil “começar” uma editora que abrir um botequim. Então, há uma altíssima “taxa de natalidade” de editoras. Só que acompanhada também por uma igualmente alta “taxa de mortalidade”. Essa profusão de editoras novas tem um papel importante na bibliodiversidade: apostam mais em autores de vanguarda, novos, etc. Só que quando esses autores se firmam, são capturados pelas grandes, que são mais conservadoras em suas linhas editoriais. Então, a “concentração” se dá pelo crescimento e fortalecimento de um grupo seleto de editoras, mas não impede o surgimento de muitas editoras menores. As grandes são grandes hoje porque cresceram e se fortaleceram, não porque foram adquirindo ou jogando fora as editoras menores.
– Quais características que diferenciam o mercado brasileiro de outros, como Europa, Estados Unidos e América Latina?
Já respondi em parte à pergunta. Sinteticamente, além do momento econômico, um grande fator a ser considerado é a composição demográfica desses países. Há um aspecto em particular que favorece o mercado norte-americano e o inglês: o idioma inglês, que se expande cada vez mais como língua franca da informação e do conhecimento, e dá base para que as editoras dos EUA e da Inglaterra possam ter uma projeção internacional maior.
Felipe, vc não quer publicá-la na íntegra, ou republicá-la na MUSA? diga lá!
Edson,
Como sou prolixo, dividi em dois ou três posts. Sinta-se à vontade para reproduzir tudo. Amanhã sai a coluna do Publish News, mas quarta eu sigo com mais um pedaço (ou o resto) das respostas que mandei para o Lucas.