A distribuição sempre foi um dos grandes entraves para a circulação de livros no Brasil. A enorme extensão territorial e a precariedade da logística encarecem de modo evidente a circulação dos livros (não apenas deles, é claro), e a rarefação e concentração da rede de livrarias contribui para não dar densidade nem permitir maiores investimentos na área.
Some-se a isso a política de aquisição de livros do Governo Federal. As compras do MEC, chegam perto de um quarto de todas as vendas de livros no Brasil, com especial ênfase para o livro escolar. O MEC compra diretamente das editoras e o transporte fica por conta dos Correios. A alegação de que esse procedimento diminui os custos da aquisição dos livros é contestável em vários aspectos: a) o MEC não contabiliza os custos de desenvolvimento editorial, que são portanto transferidos para os demais segmentos destinados ao mercado das escolas particulares e, dessa forma provocam a constituição de uma espécie de subsídio cruzado; b) também não se contabiliza os custos todo o aparato burocrático do FNDE, dedicado ao sofisticado sistema de seleção dos títulos, avaliação da execução do programa, etc c) e não se leva em conta o custo social da destruição da rede de livrarias, processo para o qual as escolas particulares também contribuem ao adquirir e revender diretamente para seus alunos os livros adotados.
Tudo isso é custo real que jamais é claramente explicitado pelo governo. E há modelos alternativos para todo esse processo que não são sequer considerados, como os aplicados em vários países europeus.
O curioso é que o MEC, através do mesmo FNDE, executa políticas diferentes para outros produtos e serviços oferecidos às escolas, como o Programa de Merenda Escolar, além do Dinheiro Direto na Escola.
Some-se a isso as deficiências das próprias livrarias, incapazes de cooperar entre si para minimizar alguns desses custos, desenvolver o mercado, participar do e-commerce. Também não faltam exemplos, como as ações da American Booksellers Association – ABA e seu programa Indie Commerce, ou as várias iniciativas dos Groupements de Libraires franceses.
Quando começamos a falecida Marco Zero, lá pelo início dos anos 80, a situação era bem diferente (não necessariamente melhor). Havia dezenas de distribuidoras de maior ou menos porte, espalhadas praticamente por todos os estados. Algumas, na verdade, eram livrarias que se colocavam como distribuidoras, mas só vendiam os livros para as concorrentes depois de atender a seus próprios pontos de venda. E os livros que mais vendiam muitas vezes não eram disponibilizados para as outras livrarias locais. Uma das características dessa época era a chamada “cota novidade”, automaticamente enviada pelas editoras a esses distribuidores, em venda fechada.
Obviamente isso não existe mais. Ao contrário, a diminuição – ou quase extinção – dessas distribuidoras locais é um fato. O predomínio do sistema de consignações exige das editoras, particularmente das menores, um esforço no capital de giro que dificulta cada vez mais sua sobrevivência.
Mas essa extinção se deu também pela incompetência administrativa de muitos desses distribuidores. Alguns anos atrás, quando fui a uma feira em uma das capitais da região Norte, ainda visitei o depósito de uma das mais tradicionais: galpão imenso, lotado de livros que ninguém sabia quais eram nem onde estavam, tudo registrado manualmente. Fechou, é claro. Mas o pior é que isso ainda se repete, em escala diferente, pelo Brasil afora. Por enquanto.
O que ainda sobrevive, embora em escala menor que décadas atrás, são as distribuidoras que na verdade são representantes das grandes editoras didáticas, e que trabalham a venda dos livros escolares nas livrarias da região, particularmente com a divulgação dos títulos junto aos professores das redes pública e particular.
Tal como a concentração das editoras (que não impede o nascimento – e morte – de uma grande quantidade de novas editoras a cada ano), a concentração aconteceu também no segmento da distribuição.
Como a concentração das livrarias acontece no sudeste, e particularmente em S. Paulo, aqui surgiram algumas iniciativas interessantes.
É o caso da Superpedido, da Acaiaca e da iSupply. Além da DLD – Distribuidora de Livros Digitais, que é um caso à parte, pois é uma associação das editoras Record, Objetiva, Sextante, Rocco, Planeta, L&PM, Novo Conceito e da canadense Harlequin, constituída especialmente para a distribuição dos produtos em formato digital.
A Acaiaca teve sua origem em Belo Horizonte. Mudou-se para S. Paulo e hoje, além da operação de distribuição de várias editoras para o varejo, desenvolveu também um sistema de distribuição de livros digitais, com acordos para colocação em todas as grandes plataformas disponíveis no Brasil (Amazon, Kobo/Cultura, Saraiva, IBA, Google Books, Apple – iBooks – Samsung, além da portuguesa Wook e da americana Barnes & Noble).
A Superpedido tem uma história mais complexa. É um investimento de um dos sócios do Itaú, que começou usando a base do CBP – Catálogo Brasileiro de Publicações. Hoje empresa se associou à Tecmedd. A distribuidora opera através da Biblion, empresa de logística especializada em livros. Recentemente tentou um acordo com várias editoras para continuar fornecendo livros para a rede LaSelva, que enfrenta dificuldades financeiras.
A iSupply é a mais nova desse grupo. Incorporada com a participação de herdeiros da Disal Distribuidora, tradicional operadora de livros didáticos importados e que hoje é também Editora, juntamente com representantes de duas gráficas, a Prol e a DigitalPages (que recentemente foi incorporada por um grupo norte-americano), a iSupply resolveu investir pesadamente na informação tecnológica, construindo um novo cadastro – que presta serviços para a Nielsen BookScan – e sistemas integrados de gestão empresarial (ERP, na sigla em inglês), propondo-se inclusive vir a integrar sistemas de impressão sob demanda para o atendimento dos clientes.
Essas três empresas são representativas das mais novas tendências de distribuição de livros, com uso intensivo de tecnologias de informação para o atendimento e logística para distribuição.
As perspectivas para a solução do problema, além dos investimentos que exigem somas consideráveis de recursos, incluem a maior utilização da impressão sob demanda. A Ingram, a maior distribuidora dos EUA, e que usa amplamente esse sistema, tenta estabelecer uma ponte aqui, com um acordo ainda vigente com a Singular, um dos braços com a Ediouro. Através da sua subsidiária Lightning Source a Ingram possui fábricas de impressão sob demanda e serviços digitais espalhadas por todo o território continental dos EUA, diminuindo de forma considerável as despesas. Se considerarmos o tamanho dos dois países, esse efetivamente pode ser um dos caminhos possíveis para equacionar as questões de distribuição e logística no Brasil.
O outro lado da questão, a da revitalização da rede de livrarias, depende muito da capacitação e disposição de cooperação das livrarias independentes. E da mudança da política de compras do MEC. O que, certamente, demandaria uma ação política que o mercado editorial não parece ter disposição para empreender. Até porque, para as editoras, a venda direto para o governo é bem conveniente, e iniciativas recentes da Biblioteca Nacional para mudar isso, pelo menos em parte, fracassaram.
Boa tarde Felipe, gostei muito do seu artigo e compartilho destas mesmas dificuldades apresentadas no texto.
Tenho uma Editora, Distribuidora e Livraria em Goiás, e a logística afeta muito nos custos de distribuição.
Prezado Felipe, sou profissional do livro a 20 anos, além de professor, compartilho parte das suas ideias neste artigo, porém permita o acréscimo das fotocópias indiscriminadas, dos sistemas de ensino, muitas vezes péssimos e sem qualidade, que por falta de conhecimento dos pais, os colégios dobram o seu valor. Assim o mercado dos livros didáticos fica cada vez mais reduzido e concorrido. Sendo assim, não vejo a política do MEC no fornecimento do livro didático, como grande impulsionadora desta questão, no meu humilde entendimento pode até ser em alguns aspectos.
Agora ontem estava ouvindo na rádio Universitária da UFU um debate sobre a Escola integral e o que isto tem haver com este assunto, simples o apresentador citou sua última entrevista com o falecido Dep. Ulysses Guimarães em que o questionou “Qual o maior problema do Brasil?” em que o Deputado respondeu “EDUCAÇÃO e perguntou novamente …”e o segundo maior problema? Eis a resposta “EDUCAÇÃO”… e o terceiro? novamente a resposta “EDUCAÇÃO”.
Acho que não preciso de dizer mais nada né.
Detalhe uma boa parte dos livros ofertados pelo MEC são insuficientes, pois as quantidades adquiridas são realizadas com base no censo do ano anterior, além disto muitos livros ficam estocados nas escolas sem uso devido do aluno, pois já não atendem as matrizes curriculares dos Estados, pois como é Brasil cada um tem um…né…rsrs.
E ficamos por aqui tenha um ótimo feriado.