Semana passada escrevi um post sobre a impressão digital sob demanda (POD), no qual assinalava que um dos principais usos dessa ferramente estava sendo feito pelas empresas de autopublicação. São empresas como lulu.com nos EUA e Scortecci, Clube de Autores e PerSe no Brasil, dentre outras.
No decorrer da semana deparei com matéria publicada no site Digital Book World, assinada por Jeremy Greenfeld, diretor editorial do site, que informava sobre a aquisição, pela Penguin, de uma plataforma de autopublicação, a Author Solutions por 116 milhões de dólares. O curioso é que a Penguin já tem uma plataforma de autopublicação, chamada Book Country o que, aliás, não foi mencionado pela Penguin no comunicado de lançamento.
A matéria de Greenfield apresenta várias declarações de John Makinson, o CEO da Penguin. “Será interessante explorar oportunidades que estão em algum lugar entre a autopublicação e a edição tradicional tal como atualmente definida pela Penguin”.
Já Kevin Weiss, o CEO da Author Solutions, terá assento no conselho do Penguin Group e será responsável pela estratégia internacional da empresa que fundou e vendeu.
A indústria editorial é tradicionalmente conhecida por fazer poucos testes de público para seus produtos. Na verdade, o “teste” consiste basicamente em copiar modelos que deram certos com outras empresas ou autores. A febre do Harry Porter desencadeou uma avalanche de títulos que faziam lembrar a mágica da Rowlinson, como antes outros autores já haviam provocado o mesmo tipo de “homenagem”.
Outros segmentos da indústria cultural tem comportamento oposto. Testam o produto, às vezes exaustivamente, antes de lançá-lo amplamente.
A indústria cinematográfica, por exemplo, sempre promove uma série de pré-estreias para testar a receptividade dos filmes. E lá é pré-estreia mesmo, não festa de lançamento. Os filmes são lançados em circuito secundário e restrito, e os espectadores são entrevistados e o filme extensamente avaliado a partir de diferentes parâmetros. O resultado provoca modificações na montagem, na música, no desfecho, nos créditos. Enfim, em tudo o que for detectado como problemático, insuficiente ou ficar fora da boa apreciação dos espectadores. Define também o tipo de circuito em que o filme será lançado (ou se será lançado apenas na TV e em DVDs) e coisas do estilo.
Quem assistiu à série televisiva Smash, cuja primeira temporada se encerrou há poucas semanas, também observou o mesmo processo na elaboração de um musical da Broadway. Financiadores são convidados para assistir os números principais – e a reação deles define inclusive quem serão as estrelas ou quem vai ficar só no coro – e a estreia é feita em um mercado menor que o da Milk Way da Broadway. E olhem que não é um mercado pequeno: Boston é um dos locais de estreia mais usados. Alguns dos musicais estrelando Carmen Miranda foram testados por lá, como assinala Ruy Castro na biografia da cantora.
Nada disso existia na indústria editorial, onde os palpites abundam e a informação é escassa.
Existia?
Parece que as editoras se deram conta que a autopublicação pode ser um excelente campo de testes para autores e até para formatos. O mega-sucesso Fifith Shades of Grey, que foi criado inicialmente como fan-fiction dos romances da série Twilight, de Stephanie Meyers. Só que os encontros dos personagens de E. L. James se dedicam a esportes diferentes da chupação de sangue… O autor desistiu do modelo fan-fiction e reformulou o enredo para o contexto sado-masoquista “soft” (bata, mas não muito forte, que eu gosto!), publicou em um site próprio – que saiu do ar quando o livro foi contratado.
O exemplo não é único. Vários dos autores que são citados como casos de sucesso na autopublicação já assinaram contratos com as grandes editoras americanas, mudando seu status e seus rendimentos.
Algumas editoras então perceberam que podiam explorar de modo muito mais ativo a autopublicação. Em primeiro lugar, ganham dinheiro com isso. Mesmo que não cobrem nada para “pendurar” e-books em seus sites, os acordos com gráficas digitais para a eventual impressão sob demanda de livros em papel, esses sites ganham com a venda de serviços editoriais, de marketing e outros para os ansiosos autores autopublicados.
E a editora pode monitorar de perto o desempenho desses livros. Não apenas através do conhecimento dos exemplares vendidos. Ao usar as plataformas de leitura de e-books, essas publicações passam também a ser monitoradas quanto ao ritmo de leitura, indecisões e desistências dos leitores. O nome da coisa se chama metadados, rapazes.
Evidentemente é uma mina de ouro para a chamada “literatura de entretenimento”. O campo de testes está ali, e não apenas é barato, como pode até mesmo gerar lucros para as editoras.
Bem, Kevin Weiss vai cuidar da estratégia internacional da Author Solutions, que é propriedade da Penguin, que é sócia aqui da Companhia das Letras. Teremos uma “Soluções para Autores” pintando por aqui?