Lições e observações do Ed Nawotka

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No dia 6 de agosto passado, o jornalista Ed Nawotka, editor da  newsletter Publishing Perspectives  participou de evento organizado pela nossa PublishNews, com o apoio da Nielsen e da Livraria Martins Fontes. O tema original do seminário era “Estratégias Globais para Editores Brasileiros”. E, de fato, Ed Nawotka expôs várias ideias sobre as possibilidades de expansão global de negócios para editores brasileiros.

Assisti à palestra e não pretendo resumi-la aqui, pois isso já foi feito na newsletter do dia seguinte ao seminário.

Entretanto, quero aproveitar a oportunidade para destacar alguns assuntos tratados por ele que, para mim, foram muito interessantes.

Um preâmbulo. Altair Brasil, que foi presidente da CBL e, antes de adquirir com outros sócios, a operação da Bertrand Brasil (hoje selo da Record), trabalhou em vendas do setor gráfico e no segmento de porta-a-porta. Altair comentou comigo, várias vezes, que “quem vendia livros em quantidade eram as gráficas; livreiro vende um exemplar de cada vez”. Essa é uma lição bem clara do segmento de vendas porta-a-porta. Não deixam passar nenhuma venda, e vão atrás do cliente onde quer que ele esteja. Só para ilustrar, uma historinha que o Hamilton Terni Costa conta. Quando era diretor da gráfica da Melhoramentos, antes da unidade ser vendida, Hamilton convidou um grupo de editores e distribuidores do porta-a-porta para conhecer as instalações. No final da visita, na hora do cafezinho, quando Hamilton colocava as vantagens para que eles imprimissem na Melhoramentos, um ou dois dos visitantes revelou: haviam feito vendas de coleções para os funcionários da gráfica, durante a visita. No papo. Na hora.

Um contraste marcante com a atitude preponderante nas nossas editoras de obras gerais, nas quais “os financeiros” determinam quantidades mínimas para atendimento, e livrarias em S. Paulo levam quase uma semana para receber os pedidos de algumas editoras paulistanas…

Mas, voltando ao Ed Nawotka.

Um dos pontos que ele abordou logo no começo foi a importância de vendas para as comunidades nacionais no exterior. Os alemães, mencionou, vendem muito bem livros naquele idioma nos EUA. E nem se fala nos hispano-falantes. É verdade que a primeira geração de filhos desses imigrantes querem se adaptar à nova cultura, mas os originais e os da segunda geração se voltam em busca das raízes. Informações sobre essa diáspora brasileira podem ser encontradas aqui, inclusive a estimativa de população.

Quando mencionei que a estimativa de brasileiros vivendo no exterior já está perto de três milhões de pessoas, o comentário dele: “Puxa, isso é quase uma Irlanda!”.

Sim. Temos uma população considerável de brasileiros que vive no exterior. Evidentemente nem todos se interessam por livros, e dos que se interessam, nem todos querem ler em português. Mas, evidentemente, essa população representa um mercado, que é absolutamente desprezado pelos editores brasileiros.

Conversando sobre o assunto com a Dosh Manzano, a executiva do programa CBL/Apex de promoção da exportação de conteúdos editoriais, ela me informou que o assunto já apareceu nas reuniões, mas achavam que o custo de envio de livros tornava isso muito difícil.

                Dio mío!

Os editores brasileiros não conhecem o livro digital? É evidente que esse formato seria o mais indicado para a difusão do livro brasileiro no exterior, particularmente nos EUA e na Europa Ocidental. Mas não existe um portal destinado especificamente a esse público. Portal que obviamente deveria estar em português, mas com versões pelo menos em inglês e espanhol, até para atender quem quer aprender nosso idioma, estuda temas brasileiros ou pesquisa sobre o Brasil. É um segmento cada vez maior, como indicam os dados do Conexões Itaú Cultural – Mapeamento da Literatura Brasileira no Exterior.

Entretanto, existe um mercado específico para os livros físicos, e a prova disso são as livrarias dedicadas ao atendimento desse mercado, como conheço várias na Alemanha e na França. Theo Mesquita, da TFM, um tradicional livreiro lusófono de Frankfurt  sempre se queixa amargamente do contraste entre o apoio que recebe de Portugal e a ausência total de qualquer apoio por parte do Brasil para fretes, viagens de autores, etc. Contraste brutal com a rede de livrarias francesas espalhadas pelo mundo, que de uma ou outra maneira recebem apoio da difusão cultural francesa. Quem assiste filmes franceses pode ter notado, no final, o apoio francês para uma rede de salas de cinema espalhadas pelo mundo. Sem falar que os sistemas de impressão sob demanda estão plenamente estabelecidos nos EUA e na Europa. Não é preciso despachar nenhum livro. Pode-se imprimir  lá, um a um.

Mas já falei em outras ocasiões sobre as limitações e deficiências da política cultural brasileira para o exterior, a última das quais pode ser lida aqui.

O Ed Nawotka citou outra experiência, essa sul-africana, de minimizar os problemas de logística na distribuição do livro impresso. Trata-se de uma forma extremamente simplificada de impressão sob demanda. A Paperight, uma empresa daquele país, desenvolveu um projeto muito interessante, através do qual usa métodos muito simples de impressão, inclusive copiadoras, para vender livros em formato pdf. Ovídeo de apresentação do site é primoroso: um aluno precisa do livro, a copiadora x imprime, recebe e paga à editora, que paga os direitos aos autores. Tudo legal, sob contrato e com controle. Evidentemente o acabamento é precário, mas o conteúdo – que é a essência do livro – está lá disponível. De passagem, cabe notar que os sul-africanos incorporaram as copiadoras à rede de distribuição e venda, em vez de persegui-los com ameaças.

Exemplar por exemplar, como dizia o Altair.

Aqui, a alergia dos editores aos sistemas de impressão sob demanda ainda os leva a despachar diariamente caminhões para Salvador, Porto Alegre, Recife, carga aérea para Manaus, Porto Velho e Belém. E falamos apenas das capitais.

Bem, para quem chega a levar uma semana para entregar livros nas livrarias paulistanas (e falo de editoras com sede em S. Paulo, e a prova do pudim é fácil: basta encomendar um livro que não esteja no estoque de qualquer e-commerce daqui), a conclusão se impõe: o mercado editorial brasileiro tem uma visão estreita e limitada do serviço ao cliente, não moderniza sua logística e assim, limita o seu crescimento.

Com todas as críticas que se possa fazer à Amazon, é muito provável que o início do serviço de vendas de livros impressos aqui no Brasil vai mexer muito com essa inércia.

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