A International Publishers Association – União Internacional de Editores emitiu comunicado anunciando que considerava o formato EPUB 3 como o padrão global para publicações digitais.
A resolução foi tomada em reunião da diretoria que aconteceu este mês em Nova York, e está justificada nos seguintes pontos:
– A IPA acredita que um ambiente digital competitivo e diversificado exige a ampla adoção e uso de padrões abertos e gratuitos de conteúdo digital, disponível para editores, provedores de tecnologia e plataformas de distribuição;
– Padrões abertos que sejam desenvolvidos de modo colaborativo e independente dos que comercializam o produto proporcionam um contexto que dá aos editores liberdade para desenvolver seus negócios digitais;
– Os padrões devem ser desenvolvidos de modo transparente, includentes e neutros do ponto de vista dos modelos de negócio. A indústria editorial internacional está adequadamente representada na direção do Fórum Internacional de Edição Digital – IDPF, a organização internacional de desenvolvimento de padrões para o desenvolvimento e promoção da edição eletrônica e consumo de conteúdo;
– EPUB 3 é semanticamente desenvolvido, possui navegação confiável e permite que os editores avancem da criação de documentos estáticos para experiências interativas;
– Com EPUB 3 o conteúdo pode ser codificado para distribuir a publicação em arquivos que permitem a interoperabilidade entre aparelhos de leitura e pode se adaptar sem problemas em diferentes tamanhos de exibição;
– O EPUB 3 é um padrão verdadeiramente internacional de e-books. Preenche os requerimentos de editores ao redor do mundo, inclusive com o suporte global de idiomas, tal como o layout vertical, e alternativas de escrita, leitura e direção da progressão de páginas, assim como outras capacidades tipográficas necessárias para expressar o amplo espectro de idiomas globais;
– Além disso, o EPUB 3 pode se tornar totalmente acessível para leitores incapacitados para a leitura de impressos.
Jan Bammel, o secretario geral da IPA declarou que “a edição digital agora é realmente global”, e que a IPA estimula todos os envolvidos na indústria editorial para que adotem o EPUB 3, de modo a que a indústria possa atingir um padrão global de interoperabilidade para e-books e outros conteúdos digitais.
O que está subentendido no endosso do EPUB 3 é a rejeição ao formato AZW, o Mobi modificado pelo DRM da Amazon, que não é compatível com os demais leitores de livros eletrônicos.
Notícias recentes dão conta da diminuição do ritmo de crescimento dos leitores dedicados de e-ebooks, todos funcionando com a tecnologia da tinta eletrônica. Diga-se bem: diminuição do ritmo de crescimento, que era astronômico, para índices mais parecidos com o crescimento global dos livros eletrônicos. Crescimento esse que também diminuiu de ritmo nos EUA, aproximando-se do crescimento geral da indústria editorial. Essa diminuição se dá em paralelo com o maior crescimento de tablets, e do uso de smartphones como plataforma de leitura.
Não há comparação, para o leitor habitual, do conforto de ler em um aparelho com e-ink e a leitura nos demais aparelhos.
A indicação do formato EPUB 3 como o padrão da indústria editorial é um ataque direto aos esforços da Amazon de se transformar em semi-monopolista fornecedora de livros eletrônicos. É um pouco o que acontece com o Android. A Apple leva a fama do charme, mas a quantidade de smartphones e tablets movidos pelo sistema da Google supera em várias vezes o número dos iPads e iPhones, deixando o Androide com um crescimento exponencial que vem sendo amplamente favorável à Samsumg, por exemplo.
Na medida em que cresça a oferta global de leitores que usam e-ink e que não sejam da Amazon – como o Kobo e o Tolino, sobre o qual escrevi (sem falar nos chineses) – a possibilidade de que os editores recuperem a capacidade de determinar padrões de preço para os e-books aumenta.
O comunicado da IPA, entretanto, passa ao largo de outro assunto candente: DRM. Sim, os Digitais Rights Management são outra questão em aberto.
A Amazon tem o seu, evidentemente. E quase todos os demais usam o da Adobe. Esse uso permite que todos os aparelhos que usem o sistema da Adobe possam intercambiar arquivos. Pode-se ler o livro comprado na Saraiva ou em outras distribuidoras mundiais (com as limitações de direitos de venda – a Barnes & Noble só vende nos EUA e na Inglaterra, por exemplo) e ler todos no aparelho da Kobo (e no Tolino, no Sony Reader e outros similares).
O cliente da Amazon, entretanto, está enganchado no Kindle. A menos que parta para o hackeamento dos arquivos AZW para que possam ser lidos nos outros aparelhos. E a Internet já está cheia de programinhas que fazem isso.
A questão subjacente, portanto, não é a de que tipo de DRM se está usando, e sim o uso de DRM no mercado de livros eletrônicos. Há muita gente que defende pura e simplesmente sua extinção, com o argumentos de que não impede a pirataria e dificulta a vida de quem comprou legitimamente os livros.
Mas esse panorama está ensombrecido por outro fantasma, que começa a surgir no horizonte, e por iniciativa tanto da Amazon quanto da Apple: a venda de livros eletrônicos “usados”. No que isso vai dar, não se sabe.
Pode até resultar, como diz Scott Turrow, o escritor de sucesso e presidente do sindicato dos autores dos EUA, no “desaparecimento dos autores”. Enfim, como dizem os chineses, vivemos tempos de crise, e haja confusão e palpites sendo dados para tentar adivinhar no que isso tudo vai dar.
Forçar um padrão é sempre complicado mas é desejável pelas facilidades e pela redução de custo de toda a indústria que não precisa produzir em diversos padrões. O padrão EPUB tem sido o preferencial da indústria há muito tempo, mas nada indica que será eterno. Padrões de arquivos quase sempre tem dificuldade de se atualizar para novas tecnologias e já vimos diversos “padrões” não pegarem, como o RTF para documentos. Existem diversos padrões muito bons que nesse momento estão sendo colocados na berlinda, mas nada impede que tentem forçar uma adesão baseada em funções que sejam desejáveis para os editores, como foi o caso do padrão FLASH que é proprietário mas tem muita aceitação nos browsers. A conversão entre formatos pode ser simples em muitos casos quando os diversos formatos possuem basicamente as mesmas funções, mas se o EPUB não evoluir poderá perder mercado caso algum formato permita funções desejáveis não presentes nele. Quem comprar na Amazon vai ter dificuldade de migrar seus arquivos para outros leitores que não o Kindle, mas não terá dificuldades de ler no Kindle os arquivos EPUB 3 comprados em outras lojas. Vamos ver por quanto tempo.